20/10/2015



Ao longo dos anos em que tenho me dedicado a difundir o Southern Rock pelo Brasil, me deparei com diversos textos que tentavam explicar o que é o Southern Rock, porém sempre esbarrava em um detalhe: os textos sempre eram superficiais. Tudo mudou em agosto de 2011, ano em que tomei conhecimento da tese "Southern Rock music as a cultural form" escrita por Brandon P. Keith em 2009.

Essa tese foi apresentada em 2009 como cumprimento parcial dos requisitos para o grau de Master of Arts do Departamento de Estudos Americanos da Academia de Artes e Ciências da University of South Florida.
Aos poucos, vou reproduzindo a história deste estilo de musica a qual sou fã. E quero que você, meu aluno também conheça esse ramo do rock and roll que é tão apaixonante.


Introdução


As bandas de Southern Rock dos anos 70 eram uma formação cultural que apresentava pontos de vista racial e politicamente progressivos, no Sul pós-direitos civis, através da forma cultural da música Southern Rock. Bandas de Southern Rock, como Allman Brothers Band e Lynyrd Skynyrd, reagiam às mudanças sociais e políticas no Sul, trazidas pelo movimento dos direitos civis, conciliando o orgulho da herança do sul com visões raciais progressivas, através de suas músicas.



O Southern Rock, então, é um paradoxo entre dois modos de identidade sulista. Por um lado, os músicos do Southern Rock expressavam abertamente o orgulho da sua herança e identidade sulista, através de suas músicas. Mas por outro lado, eles demonstravam visões racialmente tolerantes e politicamente liberais, as quais eram contrárias ao que podem ser consideradas visões tradicionais e conservadoras do sul, que incluíam preconceito e intolerância racial. A tensão criada nesse paradoxo é evidente na música, como também na política, do Southern Rock.



A música Southern Rock era tanto o reflexo de, como também uma resposta à mudança do estilo de vida dos sulinos, resultado do movimento dos direitos civis. A mudança política e cultural que ocorreu com o movimento dos direitos civis forçou muitas pessoas do sul a reavaliar tradições e identidades regionais. Embora muitos sulistas tivessem um forte sentimento de orgulho regional, o movimento dos direitos civis expôs muitas das características desfavoráveis do Sul, e os forçou a reavaliar o que significava ser um “sulista”. Enquanto o povo do sul reexaminava suas identidades sulistas, as bandas de Southern Rock surgiam e ofereciam uma maneira de “abraçar” o orgulho sulista, rejeitando as tradicionais visões racistas, através da forma cultural de música.



Diferente de outros estilos de música popular, como o Blues ou o Jazz, o Southern Rock não enfrentou um grande número de críticas. Foi apenas há poucos anos que acadêmicos deram uma nova olhada na música Southern Rock, com o objetivo de explorar seus significados e contribuições históricas. Alguns críticos, como J. Michael Butler exploraram os aspectos religiosos do Southern Rock, enquanto outros críticos, como Thad A. Burkhart, Ted Ownby, e Jason Eastman, analisaram a tradição e identidade branca masculina do Southern Rock. Ainda, outros críticos como C. Kirk Hutson, “estudaram” o Southern Rock no quadro mais amplo da evolução da música popular. Les Black fala da questão da raça na música do Southern Rock no seu maior trabalho, que trata de música “negra” e como ela se desenvolveu no mundo “racista” da cultura branca. Poucas pesquisas foram completadas com respeito aos aspectos políticos e raciais do Southern Rock, que é o que eu pretendo focar nessa tese.


A identidade masculina branca sulista, contudo, tem interessado aos acadêmicos e escritores através do século 20. Ao se considerar a imagem do homem sulista, é importante ter em mente W. J. Cash, um escritor e etnógrafo sulista do início do século 20. No seu livro de 1941, "A Mente do Sul", ele discute várias características do homem sulista, e descreve um estereótipo que ele chama de “helluva fella” (um grande cara).  O “grande cara” de Cash foi amplamente removido da modernidade do começo do século 20, e era independente, trabalhador, bebedor, simples, mas pronto para lutar em todas as horas. Mais recentemente, acadêmicos contemporâneos examinaram a identidade masculina sulista. Ted Ownby trabalha na descrição de Cash, acrescentando outras características que ele diz se aplicarem à imagem de um homem sulista no gênero Southern Rock. Ownby defende que tais características dizem respeito às diferenças entre os homens brancos sulistas e mulheres e negros. Em primeiro lugar, ele argumenta que os homens brancos sulistas batalham para ser independentes e não contam com os outros porque isso os colocaria na posição de escravos, mulheres, ou homens sem caráter. Em segundo lugar, os homens brancos sulistas vivem com honra e possuem desejo de se afirmar dentro de suas comunidades, e são extremamente suscetíveis a desafios. O conceito de cavalheirismo é importante nesse sentido, pois os homens brancos sulistas o vêem como sua tarefa de proteger as mulheres. Em terceiro lugar, Ownby afirma que uma característica inerente ao homem sulista do gênero Southern Rock é o racismo. Ele argumenta que homens brancos possuem há muito tempo o desejo de ter controle e poder sobre os homens e mulheres negros. Finalmente, Ownby vê o conceito do “grande cara” de Cash adequado para o homem branco sulista no Southern Rock, especialmente a ideia de que a violência é frequentemente necessária.



Embora eu concorde que a imagem do homem sulista tenha, tradicionalmente, incluída muitas dessas características, eu rejeito a afirmação de Ownby de que o racismo se aplica à imagem do homem sulista no Southern Rock. Na verdade, nessa tese, eu defenderei que o movimento Southern Rock foi uma formação cultural que procurou transpor a fenda racial e redefinir a identidade masculina sulista para qualidades racial e politicamente progressivas. Tendo vivido e crescido no Sul durante a era dos Direitos Civis, os músicos do Southern Rock tiveram um papel importante em confrontar e reconciliar essas importantes questões, tão pessoais e amargas para todos os sulistas. Como uma formação cultural, os músicos do Southern Rock tentaram alcançar isso através da música.



Embora o Lynyrd Skynyrd e Allman Brothers Band sejam talvez as bandas mais conhecidas do Southern Rock, elas foram apenas as precursoras em um gênero no qual originaram diversas outras bandas que seguiram seus passos. Essas bandas expressavam o orgulho sulista enfatizando suas identidades regionais, demonstravam tolerância racial, e viviam o estilo de vida de roqueiros barulhentos e rebeldes. Bandas como Marshall Tucker Band, The Outlaws, Charlie Daniels Band, Blackfoot, Molly Hatchet, Black Oak Arkansas, Wet Willie e 38 Special, podem ser todas descritas como bandas de Southern Rock. Ao mesmo tempo em que o Southern Rock é um paradoxo, ele é também um híbrido musical, como pode ser exemplificado na classificação multi-gênero de algumas bandas. Esse conceito também será discutido mais tarde, nesta tese.




Consideradas as precursoras do gênero Southern Rock, as bandas mais focadas nesta tese serão Lynyrd Skynyrd e Allman Brothers Band, com a discussão suplementar de outras bandas de Southern Rock, quando for relevante. Essa tese combina três interesses pessoais: política, história e música. Baseada em entrevistas com músicos do Southern Rock, crítica acadêmica da literatura existente no assunto, informações biográficas, e análise da música, essa tese explora as relações entre raça, política, e o Southern Rock. A música Southern Rock é inerentemente política no fato de que ela confronta questões sociais e raciais. Em um contexto mais literal, o Southern Rock é político, já que o Allman Brothers Band, o Lynyrd Skynyrd, e o Marshall Tucker Band fizeram campanha em favor do conterrâneo sulista Jimmy Carter, durante a eleição presidencial de 1976.





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